Lee Wai Yin nasceu em 11 de janeiro de 1938 na cidade de Tai San, província de Cantão (Kuang Tong), sul da China, onde começou a treinar arte marcial chinesa com seu irmão de sangue Chiu Ping Lok (mais conhecido como “Lope”). Filho de Lee Tai Kin, pai disciplinador que tinha a finalidade de preparar o filho para a vida, mestre Lee sempre carregou consigo a simplicidade, honestidade, e a educação aprendidas quando criança. Desenvolveu gosto pela poesia, folclore, caligrafia chinesa, artes plásticas, desenho, e também esportes como ginástica olímpica e jogos com bola. “Todos os esportes, menos nadar!” ele diria sorridente. Mas devido às más condições no país, aos 18 anos de idade decidiu ir para Hong Kong deixando a China socialista rumo ao enclave britânico capitalista.
Já em Hong Kong, Lee Wai Yin ainda não estava satisfeito. A densidade populacional era altíssima, a vida também era muito difícil, as disparidades sociais enormes. Percebera ele que não era a mudança do sistema econômico que traria as melhorias procuradas. Muitos chineses, procurando melhores condições de vida, intencionavam dirigir-se aos Estados Unidos escolhendo o Brasil como país intermediário pois o visto de entrada seria mais fácil de ser concedido através de nosso país ao invés de diretamente da China ou mesmo Hong Kong. Sendo assim, aos 24 anos e com uma maior bagagem de arte marcial o então jovem Lee Wai Yin, junto com o irmão Lope, decidiu rumar ao Brasil. Queria melhorar a condição de vida ao mesmo tempo em que nutria um sentimento aventureiro, o gosto de liberdade.
Como não poderia deixar de ser, o Brasil o conquistou. Com forte sotaque cantonês, certa vez disse: “Queria mudar de vida e gostei do Brasil. Aqui tem gente muito boa”. Encontrou no novo país sua morada e aqui aos poucos foi se estabelecendo, trabalhando nos mais diversos ofícios e treinando austeramente o kung-fu (vários estilos, com ênfase no Hung gar) e o tai chi chuan, testemunhando a fundação – por parte de mestre Lope – da primeira academia brasileira registrada de kung-fu no Brasil assim como o surgimento do estilo Fei Hok Phai de kung-fu. Porém, ao contrário do irmão, mestre Lee era um itinerante por excelência: morou até o início da década de 1990 em São Paulo-SP, Santo André-SP, São Vicente-SP, Curitiba-PR e Florianópolis-SC, com frequentes viagens para os Estados Unidos e Canadá, não podendo ter alunos de modo sistemático até então.
No fim da década de 80 supervisionava a Asada Academia, a então filial de São Vicente sob responsabilidade dos irmãos Hidenori e Milton Asada, a fim de acompanhar o aperfeiçoamento técnico dos alunos… Até decidir partir para a China em 1990 para estudar acupuntura, moxabustão e massoterapia na Universidade de Beijing (Pequim), atividade que exerceu até o fim da vida tratando e curando diversas pessoas. Ainda em Beijing, treinou e aperfeiçoou seu tai chi chuan com o mestre Wu Siang Kuang e a mestre Yang Lee: formas do estilo Yang tradicional, formas padrões do comitê esportivo chinês, e também tui-shou.
Em 1992, já de volta ao Brasil, desta vez na cidade de Santos-SP, abriu a academia Tein Ti Lei na região conhecida como Ponta da Praia, e posteriormente inaugurou a academia Kun Lun na Rua Carvalho de Mendonça 543 no ano de 1998, por onde passou diversos alunos de kung-fu e tai chi chuan. Em 1995 é reconhecido como mestre do estilo Fei Hok Phai, sendo tal título endossado pela comunidade praticante de artes marciais chinesas no Brasil. Também era evidente sua perícia na percussão do tambor chinês, assim como sua expressão cênica nas folclóricas danças chinesa do dragão e do leão.
Em muitos campeonatos de kung-fu, apesar da estrutura de primeiros socorros presente como manda o bom senso de organização, era comum praticantes machucados sentirem-se mais seguros sob os cuidados de mestre Lee e suas mãos curativas.
No dia 22 de agosto de 2009, após muito sofrimento por parte de toda a comunidade Fei Hok Phai, mestre Lee perde seu irmão Chiu Ping Lok (Lope) por motivo de doença – o que muito o entristeceu – tornando-se a maior autoridade técnica do estilo Fei Hok Phai. Porém, poucos dias depois, ainda muito saudável e vigoroso pelas práticas marciais e terapêuticas, uma fatalidade fruto de nossa sociedade doente encerra sua vida com dois tiros, nos deixando órfãos não só de um mestre mas também de um grande amigo. Como muitos dos antigos mestres, mestre Lee Wai Yin morreu lutando, luta que percorreu o tempo cronológico desde a ameaça dos tiros até a luta pela própria vida no caminho do hospital dentro de uma ambulância. O dia 18 de setembro de 2009 foi marcado por muita dor. O velório e o enterro foram marcados por muito luto, indignação, revolta e emoção por parte de alunos, ex-alunos, amigos, familiares, “sobrinhos” os quais eram alunos de seu irmão mestre Lope, membros da Associação Cantonesa de São Paulo, e também outros professores e mestres de outros estilos de kung-fu.
Mestre Lee Wai Yin viveu com a simplicidade, a humildade, e a vontade de aprender até o fim da vida, características dos humanos mais sábios, seja ensinando-nos práticas saudáveis, seja tratando problemas crônicos de doentes, seja como ativista da Associação Cantonesa de São Paulo, ou até mesmo jogando bola com crianças com menos de 1/6 de sua idade. E esta foi a maior lição que ele nos passou.
Destarte, apesar de nossas sinceras limitações, em homenagem a este grande mestre decidimos continuar seu trabalho com a mesma alegria, a mesma humildade, e o mesmo objetivo que ele detinha: promover a saúde, a atividade física, e principalmente a amizade, colaborando com a manutenção do espaço da academia como um espaço de alegria conforme o desejo dos filhos do mestre.
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